Pesquisa revela: Não
se trata de mera frescura: a ciência diz que existe, sim, a crise da
meia-idade e que ela afeta homens e mulheres em todo o planeta.
Resultados
de pesquisas em vários países, na última década, têm mostrado que essa
fase bate em média entre 40 e 50 anos, mas varia muito de acordo com a
região.
Mas
um dado novo, curioso e surpreendente indica que a crise é só o fundo
do poço. Depois de atingir o ponto mais baixo de "bem-estar" (alguns
pesquisadores chamam mesmo de "felicidade"), a pessoa dá a volta por
cima e vai ficando mais feliz por quase todo o resto da vida.
É estranho, pois o senso comum indicaria que a felicidade tende a diminuir a cada velinha no bolo de aniversário.
Os
gráficos ligando satisfação pessoal e idade mostram uma curva em "U". A
felicidade começa alta, vai caindo até chegar à base da letra e volta a
subir com a idade.
Os
números variam muito, porém. Em uma pesquisa, a meia-idade chega aos 50
para americanos; em outra, aos 44,5. Os brasileiros atingem a crise aos
46,7, para um estudo, e, para outro, aos 36,5. Na Ucrânia, o mal-estar
máximo chega aos 62,1 anos.
"Essa
diversidade vem das amostras pequenas nesses países. O número varia
menos em grandes amostras", diz um dos autores do estudo da curva do "U"
do bem-estar, o economista Andrew J. Oswald, da Universidade de
Warwick, Reino Unido.
O estudo analisou 500 mil pessoas, entre americanos e europeus, que responderam sobre seu estado emocional.
Depois
de se checar detalhes que poderiam afetar os resultados (renda, vida
afetiva etc.), conclui-se que americanos atingem a crise aos 52,6 e
europeus, aos 46,5.
"A Segunda Guerra parece ter cobrado um preço maior dessa geração de europeus", na interpretação de Oswald.
E o que explicaria o fenômeno em geral?
ACEITAÇÃO
"Minha
teoria é que na meia-idade enfrentamos nossas deficiências e as
aceitamos. Então ficamos mais contentes com a vida", diz Oswald. "Eu
poderia ter sido jogador de futebol e feito gols contra o Brasil, mas
percebi que teria de me contentar em ser professor", brinca.
Outro
estudo criou um "instantâneo da distribuição pela idade do bem-estar
psicológico nos EUA" com base em 340.847 pessoas. E cravou a crise em
torno de 50.
Nesse
estudo, a pessoa avaliava, numa escada com degraus de zero a dez, como
se sentia em relação à vida. "Em qual degrau você se sente agora?" era a
pergunta.
O
líder da pesquisa, Arthur A. Stone, da Universidade de Stony Brook,
disse à Folha que considera a curva em "U" um enigma. "Nós e muitos
outros estamos investigando fatores responsáveis, mas ainda não
sabemos."
Entre
os fatores que eles esperavam que teriam impacto no resultado e não
tiveram estão o gênero, o fato de ter filhos com menos de 18 anos em
casa, o desemprego e a falta de um parceiro.
Já
o pesquisador Andrew Clark, da Paris School of Economics, usou dados de
uma pesquisa britânica para seus estudos sobre a curva do "U". Um
questionário com 12 itens registrou as sensações de estresse, depressão e
falta de confiança dos entrevistados.
As
pessoas responderam se perdiam o sono por preocupação, se se sentiam
sob pressão, se perderam a autoconfiança e se pensavam em si como alguém
sem valor.
Clark disse à Folha que a curva em "U" reflete o que acontece com gente de mais idade: promoções, filhos etc.
"A
diferença entre os países reflete as diferenças nesses fatores. Se você
tem filhos aos 20, está lidando com adolescentes aos 35, se tem filhos
aos 35, vai lidar com adolescentes aos 50. O divórcio também pode
ocorrer em diferentes idades, em cada país. Isso soa como explicação",
diz.
E lidar com adolescentes estressa qualquer cristão.
Clark
também concorda com Oswald sobre a influência da perda de altas
expectativas no aumento do bem-estar após a meia-idade. E dá o mesmo
exemplo do jogador de futebol, embora o seu seja mais nacionalista: "Um
dia desses eu desisti de jogar pela Inglaterra".
A
psicóloga Laura Carstensen, da Universidade Stanford, EUA, é autora de
uma teoria pioneira que explica a alta da felicidade na velhice.
SELETIVIDADE
Segundo
a sua "teoria da seletividade socioemocional", à medida que os
horizontes de tempo vão ficando mais curtos, as pessoas priorizam
determinados objetivos emocionais. Passam a evitar amigos chatos, por
exemplo.
"A
experiência emocional fica melhor com a idade porque as pessoas passam a
investir esforço em assuntos importantes para elas", escreveu
Carstensen em artigo na "Psychology and Aging".
O artigo descreve um experimento diferente dos outros.
Enquanto
os dados coletados por Oswald e Stone produziram um "instantâneo", uma
amostra pontual na população, a equipe da psicóloga seguiu um mesmo
grupo de pessoas por uma semana e repetiu o questionamento cinco e dez
anos depois.
A
equipe concluiu: "O envelhecimento está associado com bem-estar geral,
maior estabilidade emocional e mais complexidade, evidenciado pela maior
ocorrência simultânea de emoções positivas e negativas".
Dá
para entender a capa da revista francesa "Le Point", com uma bela
mulher sorridente, a estilista Inès de La Fressange, 53, e o título: "A
vida começa aos 50".
Ou porque, quando pediram ao dramaturgo Nelson Rodrigues (1912-1980) um conselho aos jovens, ele foi incisivo: "Envelheçam"
RICARDO BONALUME NETO
DE SÃO PAULO
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